A Pior Pessoa do Mundo (NOR, 2021), dirigido por Joachim Trier, recebeu duas indicações ao Oscar 2022: Melhor Filme Estrangeiro e Melhor Roteiro Original. Segundo o diretor, a intenção da obra é apresentar um olhar sério para as dificuldades de conhecer alguém quando se está lutando para descobrir sua própria existência.
Renata Reinsve, que protagoniza o longa no papel de Julie, havia desistido da carreira de atriz para se dedicar à carpintaria, cujo ofício apaixonou-se recentemente. Trier conseguiu convencê-la a voltar a atuar, quando entregou o roteiro com a intenção de que ela protagonizasse o filme.
O longa homenageia a música brasileira com uma versão instrumental de Águas de Março, de Antonio Carlos Jobim, por Art Garfunkel.
Estimado em € 5 milhões, o longa entrou na lista dos 14 filmes favoritos do ex-presidente dos Estados Unidos, Barack Obama, em 2021.
Abaixo, escolhi quatro cenas de A Pior Pessoa do Mundo para exemplificar a gramática audiovisual empregada. Há um pouco de decupagem, elipse e off. As cenas estão disponíveis em meu Twitter.
1) Nesta cena de 1'24'' de duração, o roteiro é trabalhado através de diálogos. Numa mesa de jantar, seis pessoas conversam em clima bucólico. Julie (Reinsve) afirma que sabe tudo sobre os problemas masculinos, pois são representados no livros e filmes. Ela indaga: "Onde está o período menstrual? Orgasmo e desejo feminino? Onde?". Ela teoriza: "Se homens menstruassem, ouviríamos sempre sobre isso.". Um homem de 45 anos está na mesa ouvindo e questiona: "Você pode womansplain isso melhor?". A partir de então, ambos discorrem sobre mansplaning e womansplaning.
2) Nesta sequência de 2'17'', a decupagem alterna planos gerais e médios através de movimentos de câmera com panorâmica e steadicam para mostrar o estado de contemplação e solidão de Julie. Sem diálogos e apenas sons diegéticos, vemos a personagem emocionar-se enquanto vaga sozinha pelas ruas numa breve elipse até o anoitecer.
3) Nesta cena de 48'', Julie está sozinha de frente ao computador. Subitamente, ela tem uma ideia. Vemos as palavras digitadas na tela, enquanto escutamos uma voz lendo o texto. O off empregado aqui não só conota o pensamento de Julie, como também carrega emoção ao que é escrito.
4) Nesta cena de 1'09'', sons diegéticos e não-diegéticos são compostos de maneira híbrida. Julie abre a porta de um quarto de hospital. Vemos em desfoque Aksel (Anders Danielsen Lie) com fones de ouvido, enquanto escutamos um som estridente de fundo. A câmera aproxima-se de Aksel, enquanto a intensidade da música aumenta. O corte para o plano de detalhe dos tênis All Star do personagem coincide com o bumbo da bateria, quando e o som da música torna-se pleno e sem ruídos. Assistimos a Aksel tocar empolgado uma bateria imaginária até ser interrompido por Julie.
(NOR, 2021)
2h08min
roteiro Joachim Trier e Eskil Vogt
direção Joachim Trier
Comments