Jogos Mortais (EUA, 2004), estreia de James Wan como diretor, é um dos filmes de terror mais lucrativos de todos os tempos. Com um modesto orçamento de US$ 1,2 milhão, o longa arrecadou mais de US$ 100 milhões nas billheterias pelo mundo. O diretor deve ter ficado feliz, afinal, ele abriu mão de um salário adiantado para dirigir o longa e, em troca, preferiu receber um percentual sobre o faturamento.
Durante os 18 dias de filmagem, a equipe de produção ficou impossibilitada de rodar cenas externas. Wan optou por rodar as cenas dentro do banheiro de maneira linear para assim trazer verossimilhança às interpretações. A cena de abertura, por exemplo, quando Adam (Leigh Whannell) está com a luz azul flutuando na banheira foi, de fato, a primeira cena na primeira diária de filmagem.
Wan originalmente pretendia filmar Jogos Mortais em 2,35:1, o tradicional formato para película, também chamado de Cinemascope. Contudo, devido a restrições orçamentárias, a equipe rodou em 1,85:1, formato também conhecido como 16:9. Escrevi mais sobre janelas e formatos no meu blog.
A construção do boneco Jigsaw foi concebida do zero, sem precedentes. De acordo com o diretor, a construção do rosto envolveu argila, papel marchê e bolas de pingue-pongue preta para a construção das íris. Rolos de papel toalha foram usados para preenchimento e, para ganhar movimento, linhas de pesca foram acopladas para transformar Jigsaw numa marionete.
Abaixo, escolhi quatro cenas de Jogos Mortais para ilustrar a gramática audiovisual empregada. Há conceitos como flashback e inserções. As cenas estão disponíveis em meu Twitter.
1) Nesta cena, com 1'10'' de duração, a inserção diegética deslocada é utilizada para emular as imagens de uma câmera de vigilância. Para chegar a esse resultado final, a equipe filmou os ambientes separadamente para depois uni-los na pós-produção. Wan admitiu que a ideia desta inserção nasceu durante a montagem, quando ele percebeu que não tinha planos de preenchimento suficientes para a cena. Um detalhe desta cena é que os movimentos de câmera refletem as emoções e a personalidade de cada personagem. Enquanto Dr. Gordon (Cary Elwes) é enquadrado com planos estáticos, as cenas de Adam (Whannell) são feitas com câmera na mão.
2) Outro momento quando a inserção é utilizada ocorre nesta sequência de 1'17''. Primeiro, temos a imagem da imagem, ou seja, a projeção filmada da tela de televisão. Depois, no segundo ato da sequência, quando os detetives iniciam as investigações, fotos still em preto e branco são exibidas com efeitos de transição. Uma curiosidade: o mapa usado pelos detetives aqui é, na realidade, o mapa de Washington, DC, nos Estados Unidos.
3) Diversos flashbacks são utilizados na narrativa do filme. Neste, com duração de 2'14'', o gatilho da lembrança ocorre quando Dr. Gordon (Elwes) pega o celular. A transição para o flashback é abrupta, sem fades e diferença cromática. Na reconstituição, ouvimos a voz do ator agora em voice-over. Os primeiros planos são intercalados por fades suaves até a aparição do vilão, quando planos subjetivos e o slow motion são empregados. Ao voltar ao tempo presente da narrativa, o personagem está com o olhar distante e pupilas dilatadas, em choque pela lembrança.
4) Nesta sequência com 1'04'' de duração, o mesmo flashback anterior é empregado sob outro ponto de vista. Desta vez, o gatilho da lembrança parte de Adam (Whannell). Ele surge neste flashback como um paparazzo. Volta para o tempo presente da narrativa, Adam pega as fotos impressas numa bolsa e as atira em direção a Dr. Gordon (Elwes), enquanto mais uma vez o recurso de inserção é usado para projetar rapidamente as fotos na tela. Adiante, Adam explica a razão porque perseguiu Dr. Gordon e inicia-se mais um flashback seguido por inserção de fotos.
(EUA, 2004)
1h41min
direção James Wan
roteiro Leigh Whannell e James Wan
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